Lindolfo Roberto Nascimento tem 36 anos, é paulistano, negro e periférico. Graduado em Comunicação das Artes do Corpo e em Comunicação Social com habilitação em Publicidade e Propaganda, ambas pela PUC-SP e como bolsista, atualmente é mestrando no programa de Comunicação e Semiótica da mesma universidade. Além de sua atividade em literatura, integra ainda a Companhia Solitária de Artes do Corpo. Os poemas a seguir estão presentes em seus livros Medusa em Braile (2021) e Mandala Naïf (2020), ambos publicados pela Desconcertos Editora.
ELAS PORTAVAM GRANDES ARPÕES
Foi assim, do nada. De um bilhão de anos pra outro, tudo mudou de forma: os elefantes, cansados, simplesmente esqueceram. E o mundo girou ao contrário na órbita da agulha. As baleias saíram do mar, e entregaram suas crias para que os homens amamentassem. Todo mundo tinha lido atentamente o título, e ninguém as desobedeceu.
APAGAME
Essas alianças extremamente fugazes. Fadadas ao fracass
Esse medo no esfíncter descontrol
Os assaltos às cas
assaltos dos quais não levamos nada (elas estavam vazi
Tanto esforço inút
Levado pelas calh
Sumindo nos bueiros da memó
Pra dormir um sono fodid
de indigente, os olhos cobertos com um pano de pra
Num dia bom é o ponto alt
Numa boa vida é esquecid
Palavra por palavr
Palavra po
Palav
PROMESSA
No próximo ano continuaremos com essas marretas, a investir contra os muros de nossas miragens.
ESPARTA
“Esparta não faz guerra durante a carneia”
Esparta também não faz guerra antes. Nem mesmo depois. Esparta simplesmente não faz guerra. Esparta é bonita por natureza.
O RUÍDO E A CABEÇA
Eles estavam aqui ontem,
século passado,
e antes do alcance da memória.
Gritavam palavras de ordem
Falavam de Deus, família e pátria
Caçavam indigentes e expatriados
devassos e artistas;
davam choques em Artaud,
Perseguiam Büchner
e ignoravam Carolina Maria de Jesus
Assim poetas deixaram de nascer
morreram, líquidos, em abortos espontâneos
“Guernicas” deixaram de existir,
já que não havia quem as retratasse
E muitas Alepos se repetiram
sem possibilidade de reflexão:
As águas da história levaram e trouxeram de volta
a sujeira de um frigorífico sem portas.
Foto de Leopoldo Cavalcante.